domingo, 18 de novembro de 2012

Todo mundo mente.

Jurei que nunca faltaria com a verdade, mesmo que a verdade fosse dura como pedra, mesmo que fosse daquelas de rasgar a pele, partir o coração em dois. Desde sempre, jurei ser sincero. Mas parecia que os outros não haviam feito esse mesmo juramento. Eu, que nunca tinha motivo para desconfiar, confiava. Eles, que não tinham nada a perder, me cegavam. Ouvi histórias que dariam filmes se não fossem mentiras disfarçadas. E mesmo assim, com tanta invenção sussurrada no ouvido, eu nunca faltei com a verdade. Até que um dia me convidaram para sair. Eu passei o meu endereço. Estava tudo certo. Trinta minutos depois eu estava sentando na sala esperando meu celular tocar, para que então eu abrisse a porta e descesse até o térreo para encontrá-lo. Uma hora, uma hora e meia... Comecei a ficar impaciente. Resolvi ligar para saber se alguma coisa havia acontecido. Caixa postal. Pensei em mandar mensagem, mas achei melhor não. Nós iríamos a um clube noturno e sendo assim, decidi ir até lá sozinho. Ele já havia me animado para sair e eu estava arrumado, por que ficar em casa? Enquanto estava a caminho dentro do táxi, fiquei pensando se não deveria voltar e ficar em casa. Afinal, o que eu estava fazendo exatamente? Deveria ter tirado a roupa, colocado minha cabeça no travesseiro e deixar pra lá. Certas coisas não devem ser remediadas, devem ser apenas... ignoradas. Não ignorei. Não era mais hora de pensar em voltar. Chegando no clube, resolvi ligar para alguns amigos e ver se tinha algum conhecido que estava por lá para que eu não ficasse sozinho. Felizmente, havia. O ambiente estava agradável, e a música te convidava a arriscar alguns passos na pista. Uma hora depois, entre alguns pulos e risos sem sentido, provavelmente efeito do álcool, vi ele chegando aparentemente sozinho. Enquanto eu passava pelas pessoas para poder chegar até ele, alguém do fundo vinha se aproximando e agarrou a sua mão. Parei no meio do caminho com uma garrafa na mão, sem saber se continuava, ou voltava e fingia que não tinha visto absolutamente nada. Na minha cabeça, isso deve ter durado uma eternidade. Respirei fundo e continuei atravessando aquele mar de pessoas animadas. Alguns pés esmagados depois, cheguei até ele.

- Oi, achei que você não viria, eu disse.
Ele largou a mão do outro rapidamente e respondeu.
- Eu não confirmei pra você que eu iria mesmo sair, então... acabou sendo de última hora.
- Ah, tudo bem.
- Você ficou chateado?
- Claro que não. 
- Meu celular estava descarregado. Você deve ter me ligado, né? Pra saber se eu viria ou não.
- Não, nem lembrei de te ligar... De qualquer forma, eu já iria vir pra cá mesmo com alguns amigos.
- Quer beber alguma coisa?
- Não, eu tô bem, já estou bebendo. Bebe você. Ou então, oferece para o rapaz que veio contigo. Enfim, eu tenho que ir, até mais. 

Aquilo havia me chateado. Não por ser ele, mas por aquela não ter sido a primeira vez que haviam mentido descaradamente. Eu também menti. Eu, naquela noite, tinha quebrado meu próprio juramento. Achei que nunca seria preciso faltar com a verdade, mas me enganei. Quando é para proteger a si mesmo de um possível sofrimento, até uma atitude falha é aceita como estratégia correta. Esse foi um daqueles momentos em que eu preferi mentir para não transparecer fraqueza. Quisera eu não dar importância, mas eu sempre me importo, fazer o que?

sábado, 17 de novembro de 2012

O certo também assusta.


Todas essas histórias que ficaram pelo caminho ainda me atormentam antes de dormir. Fico pensando no fim que poderiam ter tido caso ambas as partes tivessem continuado, lutado, sem terem desistido na primeira oportunidade. Tanta gente legal me dando bola, e eu fazendo gol contra, jogando para escanteio. Eu sempre querendo entrar onde não caibo, negligenciando as placas de "não ultrapasse" e me arrependendo, tentando voltar no passado e fazer tudo diferente. Colocando expectativas altíssimas em personagens recém-descobertos e desvalorizando as prováveis boas escolhas. Eu sei, eu deveria esquecer e achar que tudo está no seu devido lugar, que as coisas deveriam ter ocorrido dessa forma, que eu estou procurando motivos para explicações que, na verdade, são assim mesmo, sem respostas propriamente ditas. Mas não dá para deixar de imaginar como teria sido se eu tivesse insistido um pouco mais. Como seria se eu não tivesse deixado outra pessoa tentar no meu lugar. E pior, assistir a felicidade dela sem imaginar que ali, ao invés daquele cara, poderia ter sido eu. Em certas situações, eu admito que agi de forma correta, de acordo com o que a minha integridade manda. Em outras, nem tanto, desisti por medo de encontrar aquilo que tanto procurava, desisti por medo de estragar tudo. Antecipação é outro dos meus problemas. O certo também assusta. Eu sei, eu deixei algumas pessoas sem resposta. Sentei no canto da parede e abracei as pernas, quando deveria ter explanado tudo pessoalmente. Mas ninguém entenderia os meus motivos, porque não existiam motivos claramente embasados. Era só medo. E continua sendo medo. É como se eu gostasse de me machucar, e por isso, só tento arremessar argolas onde não há espaço para acertar. Como se algo que começasse errado pudesse dar certo lá na frente, só para que eu escrevesse uma história bonita, dizer que a minha vida não é feita de histórias previsíveis. Nessa de querer apostar em amores cinematográficos, eu continuo aos tropeços. Trazer essa criatividade hollywoodiana para a vida real tem seu preço e eu paguei caro por cada um deles. Enquanto que no filme, um casal se conhece no supermercado e terminam juntos quando sobem os créditos, na vida real você termina sendo o amante sem sequer saber disso. Uma coisa é certa: a vida não imita a arte.

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Namoro a distância. #1


A gente se falava todos os dias, se amava quase que toda hora, Ana, minha ruína era tua calma. Deitados na minha cama de solteiro, você não queria mais me deixar, eu não queria mais te largar. Eu te entendia como Einstein entendeu a ciência, e eu tinha absoluta certeza que Deus tinha te criado para ser minha. Ana, Ana, eu gritava teu nome baixinho debaixo dos lençóis, e tua pele tão macia colada na minha, arrepiava os meus sentidos quando me beijava a nuca. Eu nunca vou te esquecer, sabia? Deixastes a cidade há mais de um mês, e ainda sinto teu perfume por toda a avenida, aquela que costumávamos sentar e contar os carros que estavam prestes a capotar. Chupava os dedos melados de sorvete de limão, e eu me dava inteiro como água pra você saciar sua sede. Você gostava das mesmas coisas que eu. Separávamos toda a cebola que víamos misturada ao macarrão, detestávamos carne de fígado, dias ensolarados, domingos, e se pudéssemos nunca colocaríamos outra roupa se não nossos pijamas surrados. Terror, romance, mas nada de tiroteio. E todo dia eu me pergunto o que estaríamos fazendo se você não tivesse partido. Ana, o presente agora é tão sem graça. E o futuro nunca foi tão esperado. Eu confio em você aí longe de mim, porque como você mesma me disse uma vez: não há ninguém como nós dois no mundo. E eu acredito nisso, e eu acredito em você, porque você, diferente de todas as outras que já conheci, nunca mentiria. Vi no jornal que aí chove pra caramba. Fica mais fácil não fica? Aqui não chove muito, mas eu quase não saio, o cinema sem você me faz cochilar, é estranho não ouvir você sussurrando no meu ouvido. Será que um dia a gente ainda vai conseguir terminar um daqueles sacos enormes de pipoca? Meu tempo está um pouco corrido, ainda não terminei minha monografia, por isso a carta vai acabar ficando curtinha mesmo, assim você não cansa ao ler, né? Saudade da tua preguiça. Me escreve o mais rápido que for possível.

Com amor, Bruno.

domingo, 11 de novembro de 2012

Rompimento.

Não consigo escrever nada agora. Está tudo tão recente, tão em carne viva, que simplesmente não sai nenhuma palavra que seja. De raiva, de amor, de saudade, de desespero, de dúvida. A porta recém batida. A chave ainda caída no mesmo lugar. Eu aqui no sofá, e você lá fora. Eu costumava saber por onde você andava, e agora não faço a menor ideia. Não faço a menor ideia de quem te acompanha na rua, se está só, se já jantou ou se está apenas dormindo, com a cabeça enfiada entre os travesseiros. Agora, eu não penso em nada. Não lamento, não derramo uma lágrima, mas soa como se a rotina inteira tivesse sido mudada, se os móveis não fossem mais minha cara. A cor da parede, os lençóis, a pia do banheiro. É como se não fizesse mais sentido. Uma palavra de raiva: droga. Arremesso o vaso contra a parede. Os vidros se espalham pelo chão. Como nós dois em um rompimento brusco, inesperado, da noite pro dia. Fácil, rápido, em poucos minutos. Aos poucos, o que estava embaralhado vai tomando um rumo. Eu sei que quando a saudade apertar, eu vou tentar discar o teu telefone, por isso é melhor que eu o apague antes que eu venha a memorizá-lo. Já vou providenciar a troca da fechadura, no caso de você tentar voltar. Eu avisei, se você saísse por aquela porta, eu não abriria ela novamente. E você foi, como se já viesse ensaiando essa saída há semanas. Não há dúvida de que todo rompimento dói. Não sei exatamente quando vai parar de doer, quando eu vou me acostumar com essa rotina nova. Certamente, irei demorar um pouco para reajustar meu relógio biológico. O primeiro passo é não colocar mais o despertador para tocar às sete, que era quando você precisava levantar para trabalhar dali uma hora. O segundo passo é não me importar mais em checar meu celular de minuto em minuto, para ver se alguma mensagem ou ligação havia passado despercebida. O resto, sinceramente, eu não sei. Não existe protocolo para esquecer alguém. Infelizmente, não há manual. Terceiro, quarto, quinto passo... não importa. O importante é continuar andando.

A última rodada.

Cava, cava, antes que seja tarde demais. Agarra na mão do primeiro que te oferecer o lugar pra sentar no ônibus. Aceite carona de estranhos, agora não vale mais conselho de mãe. São os últimos minutos, a última rodada, só restam mais duas garrafas de vodka no freezer. O fim do mundo está próximo, menos de dois meses. Troque cem por meia dúzia, se reduza. Suja tua calça branca na lama, o ano novo se aproxima. Saia de casa, de segunda à domingo. Não, a hora de ser romântico já passou, agora não dá mais tempo para comprar flores, o táxi tem pressa. Não é mais permitido escolher demais, qualquer tiro que acerte o alvo já é suficiente. Pouco importa se ele gosta de filmes, ou ela prefere a cor azul. Tira o cinto da calça e manda ver. Nomes depois. Telefones, melhor não. O tempo corre, não espera, ele está bem, não precisa esperá-lo rodar a chave e abrir o portão. Essa preocupação é desnecessária, satisfazer o desejo sexual é o que importa. Foco. Não, você não quer saber se ela se importa. Não perca tempo explicando que você não é pra vida toda, que é coisa de momento, pra ser mais exato, coisa de cinco minutos. Não precisa dizer pra ele não te cumprimentar quando se esbarrar contigo, ele vai entender, uma hora ou outra. Minta se for necessário, se for para chegar onde você quer. Nos classificados do dia seguinte, um desabafo de uma assalariada: alega seriedade durante o dia, e de noite pede pra ser chamada de puta. Quer girar a roleta mais uma vez? Não, eu definitivamente estou fora do jogo.