terça-feira, 11 de dezembro de 2012

A última consulta.

Não, infelizmente não dá para voltar no tempo. Reviver romentos. Rever atitudes. Mudar o plano de curso. Infelizmente, não posso trocar as palavras duras que eu usei. Não adianta eu me arrepender. Todo o diálogo está gravado, e eu pro resto da vida terei que conviver com a história do cara que disse tudo ao contrário, que fez tudo ao contrário, que não foi fiel a si mesmo. A história do cara que foi burro e que deixou a razão ensurdecer o coração. Eu, que hoje choro assistindo programas dominicais, já me recusei a enxugar as lágrimas de alguém. Ignorei a dor alheia, fiz pouco. Eu, que hoje coleciono escritas sentimentais, já fui tão frio quanto um psicopata. Tudo isso que veio depois não será apenas uma consequência? Quanto tempo ainda tenho de reclusão até ser solto? Será que eu não tenho sido um bom rapaz? Será que eu não mereço ter a pena reduzida? Quanto tempo até esse gosto ruim de fracasso sair do céu da minha boca? Eu juro, eu tenho tentado ser mais sincero, estar mais atento. Eu tenho pensado mais nos outros do que em mim. E você sabe, eu tenho me ferido bastante por conta disso. Eu tenho rejeitado ser amado com medo de fazer o outro sofrer. Acredite, eu nunca vou fazer isso de novo. Mas eu preciso ser solto. Viver aqui dentro não dá, conviver diariamente com isso é como ter um bracelete apertando meu pulso de minuto em minuto, me lembrando diariamente daquele que eu era. Eu não sou mais assim. Eu venho mudando, a cada ano que passa, e apresentando uma melhora, como o senhor mesmo disse na nossa última conversa. Cinco anos. Doutor, eu já aprendi a lição: não se deve brincar com o sentimento alheio. Hoje, o brinquedo sou eu. Sim, foi opção minha, como o senhor bem sabe. Foi o castigo que eu me dei pra tentar me livrar de uma culpa que me dava ânsia de vômito toda noite. Só que a brincadeira ficou séria. Agora eu não consigo mais fazer outro papel. Eu não consigo mais ver um relacionamento com otimismo, sempre desisto antes de tentar. Tudo por conta do medo. Medo de fazer aquilo de novo. Sabe, eu não quero ter que assistir alguém chorar na minha frente, enquanto eu ignoro e brinco de chutar pedrinhas no chão como se não ouvisse nada. Eu não quero ter que ouvir alguém se declarar e virar a cara como se não fosse comigo, como se não estivesse só eu e ele ali, sozinhos naquele banco de praça. Cansado dessa pele de assassino que eu vesti e não consigo mais tirar. Hoje, se ele me visse hoje, se ele me conhecesse só a partir de hoje, tudo seria diferente. Ele veria que eu não sou uma pedra de gelo. Doutor, depois desses cinco anos em terapia, eu posso dizer com aboluta certeza que eu derreti. Você mesmo balançou a cabeça concordando quando eu disse isso na nossa última consulta. O problema é que ninguém consegue ver isso, inclusive eu.